quarta-feira, 11 de abril de 2012

Entrevista de Chico Malfitani ao Jornal Folha de São Paulo


foto: Erika - Depto. Comunicação dos Gaviões
fonte: Site dos Gaviões da Fiel
Entrevista do sócio fundador Chico Malfitani ao jornal Folha de São Paulo
“Está se cobrando um comportamento da Gaviões como se estivéssemos em uma sociedade suíça. E os meios de comunicação são os maiores incentivadores”.

Neste final de semana, o jornal Folha de São Paulo publicou uma entrevista
com Chico Malfitani, um dos fundadores da nossa torcida.

Confiram a reportagem na íntegra:

Fundador da Gaviões se diz contra a extinção das organizadas
Por Lucas Reis

Chico Malfitani, 61, jornalista, sociólogo e publicitário, se acomodou em uma cadeira de sua sala e avisou. “Não vou falar o que a Folha quer. Vou falar o que eu acho.”

Em 1969, a garagem dos avós dele serviu de primeira sede da Gaviões da Fiel, torcida organizada que ele fundou com outros 15 amigos no bairro do Bom Retiro. Hoje, segundo o site da torcida, são mais de 90 mil afiliados.

Ex-marqueteiro de Luiza Erundina, Francisco Rossi, William Dib e Eduardo Suplicy, Malfitani falou sobre as origens da torcida e, principalmente, os caminhos que tornaram o futebol paulista violento a ponto de matar, como no último dia 25, em que dois palmeirenses foram mortos por membros da Gaviões.

Condenou as brigas, mas defendeu a Gaviões; reclamou da mídia, que, para ele, tem culpa no cartório. Falou até do papel de Lula naquilo que chama de “crescente onda de ódio ao Corinthians”.

“Nos unimos para organizar a torcida e derrubar o presidente do Corinthians”.
Ele recebeu a Folha para a seguinte entrevista:
Folha – Quando fundada, qual era o propósito da Gaviões?Chico Malfitani – Éramos um grupo de garotos, eu tinha 19 anos. Fundamos a Gaviões para derrubar a ditadura do Wadih Helu, que
usava o clube fazia 11 anos para suas eleições de deputado. Dentro do clube, o associado não conseguia se organizar. Qualquer movimento era reprimido. Então éramos garotos, uns 15 ou 16, de todas as partes da cidade, que se sentavam sempre no mesmo lugar. Nos unimos para organizar a torcida e derrubar o presidente do Corinthians.

E o que mudou na torcida desde então?
A Gaviões mudou porque a sociedade mudou. Quantas pessoas morriam assassinadas em um fim de semana de 1969? Está se cobrando um comportamento da Gaviões como se estivéssemos em uma sociedade suíça. E os meios de comunicação são os maiores incentivadores. Outro dia, o Sportv estava metendo o pau nas organizadas às 11h30 da manhã. Nisso, entram cenas do MMA, sangue escorrendo. O Galvão [Bueno] gritando ‘direita, esquerda’, o cara socando o outro, e isso é civilizado? Os dirigentes se provocam, dão declarações irresponsáveis. E depois a Gaviões é
violenta?

Mas a própria polícia detecta criminalidade dentro das torcidas.
Quem diz que só tem marginal nas torcidas nunca foi a um estádio. Não podemos transformar essas torcidas num Taleban. De 70 mil sócios [da Gaviões], 300 brigaram. Qual o percentual? Há indução à violência, games, banalização da morte. E a gente quer que o torcedor esteja à parte disso como? A sociedade mundial está violenta. E o Brasil, principalmente os meios de
comunicação, não faz nada para mudar.
O que houve naquele domingo, quando dois palmeirenses foram mortos?
Neste episódio não tem justificativa, mas há uma explicação. Antigamente não existia isso de juntar 20 pessoas e chutar a cabeça do cara no chão. Não existia na torcida nem na sociedade. Em 28 de agosto do ano passado, espancaram o Douglas [Karim Silva, corintiano] até a morte.
Passaram a moto por cima dele e jogaram o corpo no rio. Requintes de crueldade. Não houve
punição até hoje. Então você não consegue controlar um grupo de pessoas que não aguenta mais.
Aguardou-se de agosto do ano passado até duas semanas atrás para que a polícia tomasse uma providência sobre o garoto que foi massacrado. Não deram bola. Chegou a um ponto em que quiseram se vingar. Deu nessa tragédia. Cabe aos dirigentes das torcidas e dos clubes pacificarem as coisas. AGaviões enviou à polícia um relatório de confronto com as vias mais perigosas da
cidade. Não teve inocente, e não teve massacre. Se teve algum aspecto não negativo nessa tragédia, ao menos foram dois grupos numerosos que se encontraram. Absurdo. Mas não houve 50 pessoas esmagando um coitado. Foi horroroso, não concordo, jamais participaria disso.

“…está havendo uma caça às bruxas, não vejo uma intenção real de pacificar as torcidas”.
Concorda com a proibição das torcidas?

Talvez no sentido de baixar a poeira neste momento de crise. Foi útil para que todos reflitam um pouco. O trabalho da polícia tem que ser de mais investigação. O tráfico de drogas entrou pesado em outras torcidas. Tem que investigar. Mas está havendo uma caça às bruxas, não vejo uma intenção real de pacificar as torcidas.

Algumas pessoas defendem a extinção delas.
Vamos acabar com Israel? Com a Palestina? Afeganistão? Não. Amar um clube não quer dizer que você precise aniquilar o adversário. Há uma minoria que convive com violência no dia a dia. Mas pergunte a qualquer dirigente de organizada qual é a torcida menos violenta. É a Gaviões.
Não há orientação em relação à violência, nada. Não se acaba com as torcidas porque as pessoas existem. Você pode acabar com as sedes, proibir camisa, mas elas vão continuar indo aos jogos do mesmo jeito. A questão é que o garoto que vai para a torcida organizada só escuta uma pessoa: o dirigente da torcida organizada. É o espaço dele.
Por isso tem que haver um trabalho dos dirigentes das torcidas. Veja a nota oficial da Gaviões e a nota da Mancha. Na Mancha, o pessoal mais velho, Paulo Serdan, foi largando [a torcida].
“…você frequenta o estádio, sabe que a organizada é quem apoia o time do começo ao fim”.

A Gaviões nasceu batendo de frente com a diretoria do Corinthians, mas hoje anda de mãos dadas com ela…Não. O ndres [Sanchez, ex-presidente], a vida toda foi da Camisa 12, que é uma
dissidência da Gaviões. A Gaviões sempre teve uma atitude independente, não há essa subserviência, não existe dar ingressos. E, se você frequenta o estádio, sabe que a organizada é quem apoia o time do começo ao fim. Dirigente não gosta de cobrança. Desde que pintou a história do Itaquerão, a questão política, houve um acirramento do ódio. Tenho amigos palmeirenses, são-paulinos. Virou um ódio.
As pessoas têm ódio do Corinthians. A questão política, Lula, Serra, PSDB, a Copa do Mundo, dinheiro público, acirrou os ânimos através da mídia. Nós, torcedores, sentimos isso. Você não torce para o São Paulo, você prefere que o Corinthians se ferre. Era diferente. Não havia aquele ódio. Se vir um cara na rua com outra camisa, um cara quer matar o outro.
Continua indo aos jogos?
Todos. Vou lá na arquibancada. Mas nunca mais vesti uma camisa da Gaviões nem do Corinthians no caminho para o estádio. Há anos não faço isso. Há muito ódio, e esse ódio só vai
ser resolvido se os dirigentes tomarem providências. Quanto o futebol fatura hoje? A Nike, a Globo, o Ricardo Teixeira? A custa do sangue desses coitados que vão se matar?
Ficaria tranquilo se seus filhos fossem ao estádio junto com a Gaviões?
De ônibus, hoje, não ficaria tranquilo. A violência fora do estádio está enorme. Mas já houve momentos piores. A polícia não pode encarar o torcedor como bandido. O que precisa ser feito é uma UPP [Unidade de Polícia Pacificadora]. A PM manda 600 homens para desalojar o
Pinheirinho, manda 400 homens de sua tropa de elite para a USP e, para evitar um confronto que estava agendado pela internet, manda duas viaturas? O que querem, afinal? Que tudo exploda e o futebol fique elitizado?

Nenhum comentário: